(AL)E não, não tem a ver com a idade, nem com o crescimento dos filhos, nem com as dores nas juntas (a essas não lhes dou importância). Acho que estou a envelhecer porque cada dia me parecer mais que o mundo faz menos sentido. E isto, acho eu, é talvez o primeiro sinal de envelhecimento – quando o mundo começa a deixar de fazer sentido.Vem este meu comentário a propósito de duas ou três coisas com que hoje me deparei. A primeira foi uma
petição contra a exclusão da religião cristã na agenda anual da União Europeia. Segundo os autores da petição, a dita agenda menciona as datas religiosas de todas – ou quase todas – religiões, excepto a cristã, tendo mesmo deixado de fora o Natal. Não interessa para o caso se professo ou não uma outra religião; a minha fé, se tiver que ter uma, será a da liberdade de cada um poder escolher aquilo em que quer acreditar e dos outros respeitarem essa escolha. Este “mea culpa” europeu cada vez me confunde mais. Será que só respeito a cultura/religião dos outros se desvalorizar e penalizar a minha?Em Dezembro passado abundavam nos Estados Unidos os debates sobre o desejar Merry Holidays em vez de Merry Christmas “por respeito para com outras religiões”. Se vamos deixar de dizer Feliz Natal, iremos também exigir que, por exemplo, os judeus deixem de dizer Feliz Hannukah? Exigir que se diga jejum em vez de Quaresma ou de Ramadão? Onde acaba o respeito e começa a patetice?Ainda não estava eu refeita desta, surge-me a notícia do ultraje público criado na China por causa de um
truque realizado com peixinhos vermelhos. Aparentemente, o programa da TV oficial sobre as celebrações do novo ano lunar incluiu um ilusionista (?) com uma exibição de “natação sincronizada” com peixinhos vermelhos. Parece que suspeitam que o ilusionista usa magnetes para fazer o truque. E sabe-se lá o mal que estes magnetes podem fazer aos pobres dos peixinhos. E lá temos os activistas chineses dos direitos dos animais a criarem uma onda mundial de solidariedade. Não me interpretem mal, sou por princípio contra a crueldade. Mas peixinhos vermelhos? Num país onde se executam publicamente criminosos com um tiro na cabeça e se cobra à família o preço da bala; num país onde existem gaiolas com cães, gatos e outros animais vivos à porta dos restaurantes, para que o freguês escolha o seu petisco; num país onde se deitam fora meninas porque as famílias querem um filho varão e não podem ter mais que um descendente; num país onde se “re-educam” opositores ao regime – e isto só para dar poucos exemplos – as vozes só se levantam por causa dos peixinhos vermelhos? Peixinhos vermelhos?Por cá, vão-se
proibindo os animais nos circos e querem
acabar com as touradas. A mim custa-me a acreditar que um domador que entra numa jaula de leões maltrate estes animais. E sim, admiro a coragem dos forcados e a beleza do toureio a cavalo.Será que qualquer dia irão proibir os matadouros e dar-nos cabo do direito de comermos um bom bife, arrasar-nos os chouriços e banir os sapatos e os cintos de cabedal? E a seda – fibra oriuna da exploração de pequenas larvas indefesas? E a lã que nos aquece e é vilmente retirada das ovelhinhas tão queridas? E o queijo de ovelha ou de cabra? E os camarões e os peixinhos do mar, mortos cruelmente por asfixia para adornarem as brasas do nosso deleite? E os mosquitos?Mas abandonam-se diariamente dezenas de animais e os canis e outras instituições que os recolhem lutam com falta de fundos para os manterem e vêem-se forçados a abatê-los. Sou animal e predadora – cúmplice do abate de animais para me alimentar e sobreviver (não, uma dieta vegetariana para mim não é consolo, lamento). Aprendo no dia a dia a viver com esta realidade da minha incongruência do respeito pela vida que professo e da gula que me guia.Ah! E sim, é um post etnocêntrico e umbiguista, mas é meu. Mas peixinhos vermelhos?