
Interrogava-se aqui há dias um amigo angolano sobre o porquê de tantas localidades com o nome Angola, ou com referências angolanas, nos Estados Unidos. Dava ele como exemplo a
Congo Square em Nova Orleães no Luisiana. Local utilizado para dança e entretenimento de escravos, que tem hoje lugar de destaque como berço do jazz.Profissionalmente deformada, lembrei-me logo da famosa
penitenciária Angola de sua graça e especulei se não estariam estas referências ligadas ao tráfico de escravos. Juntaram-se mais meia dúzia de amigos ao debate, adicionaram-se mais localidades de seu nome Angola (Luisiana, Geórgia, Indiana, Virgínia, Delaware, Carolina do Norte e Nova Iorque), um supermercado de beira de estrada entre Michigan e Flórida; trocaram-se referências académicas (John Thorton e Linda Heywood, “
Central Africans, Atlantic Creoles and the Foundation of the Americas, 1585-1660”, Cambridge University Press, 2007) e ficámos a saber que num dialecto falado nalgumas partes do sul dos Estados Unidos existe a palavra “goober” para amendoim, derivada de ginguba (palavra para amendoim em Angola, Moçambique, República Democrática do Congo, etc). Entre comentos e trivialidades, um participante no debate colocou o
link para o vídeo que espoletou este postal.Lembro-me agora da minha estadia no Gana e do imenso
turismo de raízes (
roots ou ancestry tourism) naquele país. São cidadãos americanos ou caribenhos que, já na idade da reforma, se deslocam ao Ghana em busca do local de origem dos seus ancestrais escravos. Trazem
documentos e fotos antigas e embarcam nesta cruzada verdadeiramente comovente, na esperança de sentirem a pertença que em casa des-sentem. Conheci alguns quando estive num hotel da Gold Coast; eles faladores e desejosos de meter conversa, eu, curiosa e tagarela, sempre disposta a qualquer papo. Falavam-me das suas vidas boas de classe média, da casa no subúrbio, dos filhos doutorados e de sucesso; mostravam-me as fotos que traziam, desgastadas e a preto e branco; contavam-me a história desses rostos do passado que buscavam. Invariavelmente a conversa terminava com a relativa desilusão sentida com a viagem. Sim, foi bom terem vindo e terem visto África pela primeira vez (África ainda homogénea e mítica nas suas mentes); sim, foi bom terem conhecido parentes que nem da sua existência sabiam, ou então lamentavam não os terem conseguido encontrar. Mas todos continuavam com o desconforto identitário trazido de lá de longe onde moravam. Porque se se sentiam estrangeiros “lá”, mais estrangeiros ainda se sentiam “aqui” nesta terra cujos preceitos desentendiam. Via-os partir do hotel, em grupo e embarcar no auto-pullman, com a perplexidade estampada no rosto. Para darem o lugar a outros como eles que, acabados de chegar, traziam no passo aquela esperança naïve e entusiástica de quem enceta caminho.AL
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<a href="<object width=" 400"="400"" height="225" rel="noopener"><param name="allowfullscreen" value="true" /><param name="allowscriptaccess" value="always" /><param name="movie" value="http://vimeo.com/moogaloop.swf?clip_id=29769051&server=vimeo.com&show_title=0&show_byline=0&show_portrait=0&color=00adef&fullscreen=1&autoplay=0&loop=0" /><embed src="http://vimeo.com/moogaloop.swf?clip_id=29769051&server=vimeo.com&show_title=0&show_byline=0&show_portrait=0&color=00adef&fullscreen=1&autoplay=0&loop=0" type="application/x-shockwave-flash" allowfullscreen="true" allowscriptaccess="always" width="400" height="225"></embed>"></a> Diletante que sou da ciência esbarro ocasionalmente em websites que me deslumbram. Hoje aconteceu-me este, <em><a href="http://hipacc.ucsc.edu/Bolshoi/" rel="noopener">Bolshoi Simulation</a></em>, a simulação cosmológica actualmente mais precisa do nosso Universo feita com base no mapeamento da luz do Big Bang e com um super-computador capaz de calcular a evolução de uma região específica do Universo com um diâmetro de um milhar de milhão de anos-luz. Este tipo de simulação é actualmente a base para quase toda a pesquisa a ser feita sobre a estrutura do Universo e sobre a evolução das galáxias.E eu, embora incapaz de abarcar o grau de abstracção que aqui me trouxe, com ele me deslumbro e assombro-me com a beleza da sua visualização. Da mesma forma que nunca deixo de me assombrar quando olho para o céu e comento comigo que é para o passado que estou a olhar.<blockquote>It's lovely to live on a raft. We had the sky up there, all speckled with stars, and we used to lay on our backs and look up at them, and discuss about whether they were made or only just happened (<span style="color: #0000ff;"><em>Mark Twain</em></span>).</blockquote>Ai como é bom viver numa jangada!AL



Em Julho, a edição online da revista
Foreign Policy publicou um artigo com fotos da guerra no Afeganistão, que me agradou particularmente. Fotos de soldados e de protagonismo militar misturam-se com cenas mais mundanas do quotidiano. Porque mesmo em tempos de guerra a vida não pára.Talvez seja exactamente esta mistura de violência dramática e mundanidade quotidiana que tanto me seduz e atrai para cenários de conflito, onde vida e morte se casam debaixo de fogo. Como nestas fotos minhas que aqui deixo. Crianças que brincam à beira de uma estrada perante os olhares dos pais que do outro lado costuram roupa para festas. Dois lados da mesma estrada que nem duas faces da mesma moeda.AL

Não sou muito dada às artes; já por demais aqui o disse. Eu sou mais bolos. Talvez por isso me agradem tanto as instalações que, me parece a mim, tendem a enervar os mais cultos e experientes nestas lides. Agrada-me o tom geralmente irónico deste tipo de exposição. Ou do contraste dos elementos utilizados. Ou do carácter mecânico e lúdico que tantas têm. Gosto desta aqui retratada da autoria de
Beili Liu. É composta por centenas de tesouras suspensas do tecto, sob as quais a autora está calmamente a costurar uma peça feita com retalhos que cada visitante vai cortando do pano pendurado à entrada. Símbolos fálicos que ameaçadoramente vigiam a tarefa tão feminina de juntar, de unir, de remendar, que placidamente se desenrola perante nós. Punho fechado e polegar para cima:
laique.AL