Resolveu há três meses assentar arraiais em Portugal. Pergunto-lhe: como te tens dado por cá? Adora, claro!, nada de novo nela afinal. E vai-me descrevendo a rotina que entretanto alinhavou na casa onde se vai instalando. Abrimos mais um caixote e diz-me ela meditativa: Há duas coisas que me intrigam. Toda a gente que conheço me diz que não há no mundo país como Portugal, que é onde se vive melhor, que não há clima com o vosso, que a vossa é a melhor comida, o melhor vinho, o melhor azeite, as melhores praias. Mas quando digo que não, que não estou em férias e que estou cá a viver, que me mudei para aqui, olham para mim com espanto e perguntam-me mas porquê?, porque largou o seu país que é tão bom para vir para aqui? Com espanto genuíno, sabes?A outra coisa que eu não entendo é o vosso horário. As pessoas aqui deitam-se tarde. Ninguém se deita antes da meia noite, uma da manhã. E apesar da vida aqui começar relativamente tarde, as pessoas levantam-se muito cedo para chegarem a horas onde querem. Levantam-se aí pelas seis e meia, sete da manhã. Tenho-me perguntado se esta nostalgia que se vos agarra, se esta negatividade que vos acompanha não será privação de sono... Olha-me interrogadora. Eu, em vésperas de emigrar, tiro mais uns livros do caixote e dou-lhe um sorriso por entre dois bocejos.AL*